Ilha do Governador: a hora da responsabilidade participativa

Após décadas de impactos ambientais e sociais, moradores da Ilha do Governador cobram das empresas atuação concreta e compensações por danos históricos.

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Foto: Daniel Martins/Diário do Rio

Wagner Tavares, Vereador da Cidade do Rio de Janeiro, Mandatário da Ilha do Governador

Faz mais de 100 anos que a Ilha do Governador carrega os impactos de atividades portuárias e energéticas. Agora, a sociedade insulana precisa de reparação ambiental, social e urbana por parte das grandes corporações instaladas na região.

Muitos cariocas não sabem, mas a Ilha do Governador não é apenas uma região insular da cidade do Rio de Janeiro. É um território marcado pela convivência histórica entre a comunidade e grandes operações industriais, portuárias e energéticas. No século ado, esse pedaço da cidade foi transformado em base logística de combustíveis fósseis e, desde então, carrega um ivo ambiental profundo e pouco reparado.

O início dessa história remonta a 1904, quando foi instalado o primeiro reservatório de combustível do Brasil. Esse marco consolidou a região como zona estratégica para o armazenamento, refino e sua distribuição, diretamente vinculada ao processo de industrialização urbana do país.

Nas décadas de 1930 a 1950, a presença industrial se intensificou. Foram construídos tanques, píeres, dutos e bases operacionais de diversas empresas do setor. À época, não havia legislação ambiental que exigisse contenção de impactos — e a infraestrutura cresceu sem planejamento ambiental, com efeitos cumulativos ainda sentidos até hoje.

A partir dos anos 1970, a situação da Baía de Guanabara e seu entorno se agravou. O acúmulo de esgoto doméstico, resíduos industriais e acidentes operacionais gerou uma explosão de poluição, reconhecida em sucessivos relatórios do INEA, FEEMA, IBAMA e universidades públicas. A Ilha do Governador, por sua localização e função logística, foi diretamente impactada, tornando-se uma área de alta vulnerabilidade ecológica.

Entre 2000 e 2010, surgiram relatos de contaminação do solo e da água em áreas costeiras da Ilha. Estudos acadêmicos apontaram a presença de hidrocarbonetos e metais pesados no subsolo. Foram registrados vazamentos e infiltrações de derivados de petróleo — em muitos casos, sem ampla divulgação ou responsabilização pública.

Hoje, mesmo com o avanço da legislação ambiental — como a Lei de Crimes Ambientais de 1998 —, a comunidade insulana vê pouca ou nenhuma ação efetiva de requalificação. Empresas de grande porte, com décadas de operação no território, ainda mantêm baixa presença social e quase nenhuma ação ambiental compensatória visível.

Recentemente, a ocorrência de um incêndio em uma das unidades industriais da região reacendeu a preocupação da população com a falta de transparência nos planos de contingência, resposta a emergências e segurança operacional dessas instalações. O episódio evidenciou o que a comunidade já sentia: não basta operar com o licenciamento ambiental de décadas atrás — é preciso operar com responsabilidade social e comunicação aberta.

A sociedade civil insulana está cada vez mais atenta e organizada em torno das pautas ambientais e urbanas. Por isso, como vereador, empresário e morador da Ilha do Governador, tomei a decisão de liderar uma mobilização pública em defesa da requalificação ambiental, da segurança das operações industriais e da ampliação do diálogo entre essas empresas e os moradores da Ilha.

O tempo da omissão ou. Chegou a hora de virar essa página. Agora é tempo de presença, diálogo, prestação de contas e reconstrução.

Não se trata de revanchismo ou de negar a importância econômica dessas atividades. Trata-se de fazer justiça socioambiental. Se a Ilha do Governador foi base estratégica do início da cadeia energética nacional, é justo que receba, hoje, o retorno em forma de recuperação, investimento social e requalificação urbana e ecológica.

As empresas que ali operam — algumas há mais de 70 anos — precisam assumir responsabilidade proativa. Deveriam, há muito tempo, estar investindo em projetos de transparência institucional, contenção de danos, revitalização da orla, educação ambiental, compensação climática, apoio a empreendimentos sustentáveis locais e ações sociais permanentes — muito além das poucas iniciativas realizadas em outras regiões, sem impacto direto na Ilha do Governador.

Também é fundamental que essas corporações fomentem e apoiem cursos profissionalizantes e técnicos voltados para a população insulana, promovendo qualificação de mão de obra local que, inclusive, possa ser incorporada em suas próprias cadeias operacionais e de serviços.

A Ilha do Governador não pode seguir carregando sozinha o ônus de um desenvolvimento que, por muitas décadas, não a incluiu de fato. Chegou o momento de reparação, compromisso e ação concreta para benefício mútuo: das empresas, da cidade e da população insulana.

ment
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2 COMENTÁRIOS

  1. Tem que ter a taxa da poluição e usar esse dinheiro para fiscalização e para conter os danos, não da pra esperar a boa vontade dessas empresas que nem daqui são.

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